Desce as escadas do prédio. Atravessa o pátio e abre o portão. Passa para o passeio do outro lado da rua e olha para a enfiada de prédios da qual aquele que habita faz parte. De repente sente-se como o careca que jogava à carica em Caracas: apenas mais uma personagem de um conto. Uma marioneta nas mãos do destino. O vento invernal, cortante, fá-lo ter um arrepio. Aperta o botão do colarinho, levanta a gola do casaco e busca a boina basca, dobrada no bolso de trás das calças, para proteger a cabeça, já meio careca, do frio. Apressa o passo em direcção à baixa. Pelo caminho para no 1º de Maio para tomar uma bica e um bagaço. O estômago queixou-se; não era desjejum para um homem da sua idade. Seguiu em direcção à rua da Sofia, nesta cortou por uma transversal ruela torta e calcetada. A alguns metros do seu destino parou e olhou, dissimuladamente, em volta procurando aquela espécie de seres que compõem o corpo da polícia política (nunca, ao longo da sua vida, sentiu que lhes poderia chamar seres humanos). Nada. Apenas um bêbado sentado numa soleira e uma mulher da noite de regresso, cansada, ao porto de abrigo que chamava lar (e de imediato arrependeu-se de ter pensado nada, mesmo os deserdados da sociedade não são nada). Avançou os passos que o separavam do sítio, uma casa de dois pisos com um telhado de estilo oriental. Bateu com a maçaneta e do outro lado veio a pergunta: