Quinta-feira, 11 de Maio de 2006
"No meio daqueles alunos que perguntavam, ficaram muito sérios ou riam, me davam a força da ternura, não me apercebi da ausência daquela menina triste. Estava no momento de me despedir, agradecer a todos, professores e alunos, tanto amor que me fora dado, quando a menina triste que se ausentara chegou junto de mim. Com uma boneca de trapos, envelhecida pelo uso, nos seus braços magrinhos.
- Tome. É para si. Eu fui buscá-la.
Não nomeou onde fora. Mas onde chegou até mim.
Não podia aceitar.
- A boneca é tua. É a tua boneca!
- Aceite. Eu quero que fique consigo.
- Mas não…
Os olhos da menina, determinados, imploravam. Olhos maravilhosos e húmidos de uma fome que não é de pão. Compreendi. Os professores da escola ajudaram-me a compreender aquela dádiva única. Aquela boneca não lhe pertencia. Não tinha o direito de brincar numa casa sem amor. Menina que não era amada podia guardar a sua boneca de trapos? Boneca tão suja e tão linda!"
Esta história conta-a Matilde Rosa Araújo na sua curta autobiografia públicada na última página do penúltimo JL.
(deixo-a sem mais nada porque um homem também tem direito a se emocionar até às lágrimas)
De Anónimo a 11 de Maio de 2006 às 12:17
Pois é, Carlos, e o pior é que, se estivermos atentos, apercebemo-nos de tantos seres como esta menina triste, abandonados a um mundo de afronta e desamor.
E não sei o que será melhor: ignorarmos, endurecermos, ou sermos quase sempre inutilmente permeáveis ao sofrimento dos outros. E se digo inutilmente, é porque, pelo menos no meu caso, tenho a noção da minha impotência para alterar estas situações.
Mas não consigo ser-lhe indiferente, não. Por muito que doa.
Deixo-te um abraço
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